Libertinagem, O CACTO

Libertinagem, O CACTO
Manuel Bandeira

Aquele cacto lembrava os gestos desesperados de estatuária:
Laocoonte constrangido pelas serpentes,
Ugolino e os filhos esfaimados.
Evocava também o seco Nordeste, carnaubais, caatingas...
Era enorme, mesmo para esta terra de feracidades excep-
[cionais.
[cionais.

Um dia um tufão furibundo abateu-o pela raiz.
O cacto tombou atravessado na rua,
Quebrou os beirais do casario fronteiro,
Impediu o trânsito de bondes, automóveis, carroças,
Arrebentou os cabos elétricos e durante vinte e quatro horas
[privou a cidade de iluminação e energia:

- Era belo, áspero, intratável.

Petrópolis, 1925